" Só depois que a ultima árvore for derrubada, o ultimo rio for envenenado, vocês irão perceber que dinheiro não se come". Cacique Seatlle, em carta enviada ao governo dos EUA em 1855.
Os últimos verões têm sido marcados por tragédias conseqüentes das variações climáticas em diferentes lugares do Brasil. Em metrópoles como São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte ou em cidades do interior, as enchentes tornaram-se uma ameaça recorrente. O oposto, porém, ocorre em lugares como o Rio Grande do Sul que, em plena estação das águas, enfrenta o flagelo da seca, mudando as características de regiões inteiras. O que vivemos hoje é conseqüência do que "plantamos", do modelo de produção de riquezas que desenvolvemos.
Poderíamos dar vários exemplos no mundo, onde nevascas intensas, enchentes e secas geram desastres para a humanidade comparados às destruições típicas das grandes guerras.
O destempero climático é uma reação do planeta às agressões humanas à natureza. Nos últimos anos, muito se tem falado sobre os grandes temas desse início de século: globalização, avanço genético, democratização das comunicações, novas tecnologias. São temas cujo debate é necessário para definir o futuro da humanidade. Entretanto, o momento é crucial para uma reflexão profunda a respeito do que consideramos riqueza e qual o modelo de sua produção e distribuição.
A modernização do sistema produtivo internacional, com a absorção das tecnologias, mostrou ao mundo um processo civilizatório perverso. Ao mesmo tempo em que fez crescer a exploração dos recursos naturais e a produção de riquezas, produziu rendimentos baixos para a maioria dos trabalhadores, precarização das condições de trabalho, aumento da violência. Outra conseqüência devastadora foi a completa desorganização do clima no planeta.
O desafio do século XXI é romper com o modelo de desenvolvimento inspirado pela revolução industrial ocorrida na 2ª metade do século XVIII. Uma cultura de produção de riquezas e de consumo que lida com a natureza como se os seus recursos fossem inesgotáveis. A mesma cultura que transformou os espaços urbanos em objeto da ganância ou da materialização da exclusão social expressa nas moradias precárias. A lógica de produção e acúmulo de riquezas transformou os grandes centros urbanos em cenário de exclusão, destruição e mortes.
As enchentes são conseqüência da ocupação destrutiva dos espaços urbanos verificada há décadas com a complacência das autoridades. A desorganização do clima resulta de mais de um século de um modelo de produção e distribuição de riquezas que só deteriorou os recursos naturais. Pagamos hoje o preço, tanto desse modelo de desenvolvimento urbano arcaico, como de um modelo de desenvolvimento que trata os recursos naturais como objeto de lucro, em que o resultado é o acúmulo de riquezas por poucos e a distribuição da miséria entre muitos.
O desenvolvimento urbano desorganizado permite a ocupação indevida das áreas próximas aos mananciais, sem projetos apropriados de drenagem. É vital mudar a lógica dos investidores urbanos de elaboração de projetos voltados exclusivamente ao retorno financeiro, favorecidos, em muitos casos, pelo Poder Público, em uma relação de compadrio que não representa os interesses da maioria da sociedade.
O desenvolvimento equilibrado passa por um modelo de produção de riquezas que seja sustentável, o que é impossível de acontecer se não tivermos um modelo de desenvolvimento urbano que olhe para o futuro e não para a ganância do presente.
Em Araraquara, as enchentes são problemas pontuais. No geral, a cidade pode se considerar em boas condições para atravessar a temporada das águas, pois conta com um bom sistema de drenagem urbana e não sofre com ocupações irregulares de áreas de mananciais. Mas também temos que nos preocupar com o processo de impermeabilização do solo, principalmente nas proximidades dos mananciais. Com o adensamento populacional em regiões próximas aos mananciais, e a conseqüente impermeabilização do solo, não há projeto de drenagem que consiga escoar em tempo hábil as águas pluviais.
A condição da cidade é conseqüência de medidas adotadas ao longo dos anos pelas administrações municipais. Em nosso governo elaboramos um Plano Diretor amplamente debatido com a sociedade, que exige dos investidores imobiliários toda a infraestrutura incluindo galerias para escoamento das águas das chuvas e preocupação com os mananciais. O Plano Diretor foi considerado por alguns segmentos muito rigoroso, mas é preferível o rigor da lei que impeça a ocupação desordenada, a ver Araraquara se transformar em cenário de tragédias. É preciso ter em mente que as medidas tomadas hoje serão "pagas" pelas gerações futuras.
Edinho Silva
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