Pobres lotam cadeias, mas grandes entopem os tribunais
publicado em 29/04/2011
Por Marcelo SemerNa mesma semana em que a polícia divulgou suspeitas que o médico Roger Abdelmassih esteja foragido no Líbano, o ministro Luiz Fux, do STF, negou liberdade a um condenado pelo furto de seis barras de chocolate.
Mesmo reconhecendo o valor ínfimo, Fux rejeitou o trancamento da ação, porque o réu seria "useiro e vezeiro" na prática do crime.
Roger Abdelmassih teve mais sorte. Foi condenado pela Justiça paulista a 278 anos de reclusão, por violências sexuais que teria praticado durante anos contra dezenas de mulheres que buscavam seu consultório para reprodução assistida. Nas férias forenses, ganhou a liberdade em liminar concedida pelo ministro Gilmar Mendes.
Nem tudo está perdido, porém.
O furtador de chocolates não fugiu, e em relação a ele, o direito penal poderá ser aplicado em toda a sua plenitude: um ano e três meses de reclusão. Afinal, por sua reincidência, a insignificância deixou de ser insignificante.
Nos últimos anos, o STF tem sido reputado como o tribunal mais garantista do país no âmbito criminal - o que fez a decisão relatada por Fux chocar ainda mais a comunidade jurídica.
Recentemente, o tribunal tomou uma posição reclamada por doutrinadores, proibindo a decretação da prisão, quando ainda existam recursos pendentes. É com base neste entendimento, por exemplo, que o jornalista Pimenta Neves aguarda solto o desenrolar de seus vários apelos.
A decisão tem justificativa na concepção do processo penal no estado democrático de direito. Todavia, o próprio STF tem sido flexível com este padrão, quando o réu se encontra preso durante o processo. É mais rigoroso, enfim, com quem foi preso desde o início.
Como a "primeira classe do direito penal" raramente é presa em flagrante, na prática acaba sendo a principal beneficiária da jurisprudência liberal.
Um acórdão do STJ fulminou inquérito policial contra empresários e políticos, com o bem fundamentado argumento de que 'denúncia anônima' é ilegítima para justificar a devassa telefônica.
Prisões de centenas de pequenos traficantes país afora, todavia, também costumam ser justificadas por informações obtidas em denúncias anônimas. Por meio delas, policiais revistam suspeitos na rua e pedem buscas e apreensões. Custa crer que a jurisprudência se estenderá a todos eles.
Se as cadeias estão superlotadas de réus pobres, os recursos que entopem nossos tribunais têm uma origem bem diversa.
O Conselho Nacional de Justiça divulgou a lista dos maiores litigantes do Judiciário, onde se encontram basicamente duas grandes espécies: o poder público e os bancos.
Como assinalou o juiz Gerivaldo Neiva, em análise que fez em seu blog (100 maiores litigantes do Brasil: alguma coisa está fora da ordem), os esforços da justiça estariam em grande parte concentrados entre "caloteiros e gananciosos".
Verdade seja dita, o acesso aos tribunais superiores não é apenas protelatório.
Só o Superior Tribunal de Justiça, o "Tribunal da Cidadania", editou nada menos do que quatro súmulas que favorecem diretamente aos bancos, como apontou Neiva. Entre elas a que proíbe o juiz, nos contratos bancários, de considerar uma cláusula abusiva contra o consumidor, se não houver expressamente a alegação no processo.
A decisão, que serve de referência para a jurisprudência nacional, inverte o privilégio criado pelo código do consumidor. Mas a Justiça parece considerar, muitas vezes, que bancos não têm as mesmas obrigações.
O STF, a seu turno, não se mostra tão garantista em outros campos.
Avança na precarização dos direitos trabalhistas, principalmente ao ampliar a aceitação da terceirização. Em relação aos funcionários públicos, destroçou com a força de uma súmula vinculante, a exigência de mero advogado nos processos disciplinares, e com outra a possibilidade de usar o salário mínimo como indexador de adicionais, proibindo ainda o juiz de substitui-lo por qualquer outra referência.
Não há sentido mais igualitário do que o princípio básico da justiça: dar a cada um o que é seu. Regras tradicionais de interpretação das leis privilegiam sempre a equidade. Se tudo isso ainda fosse pouco, a redução das desigualdades é nada menos do que um dos objetivos principais da República.
Por mais que a Justiça julgue cada vez mais e se esforce para julgar cada vez mais rápido, não se pode deixar de lado a questão fundamental da igualdade e com ela a proteção aos direitos fundamentais.
É certo que a sociedade brasileira é profundamente desigual e que a maioria das leis aprofunda esse fosso ao invés de reduzi-lo.
Mas a obrigação de ser o anteparo da injustiça significa também impedir o arbítrio do poderoso, a danosa omissão do mais forte e a procrastinação premeditada do grande devedor.
Temos de entender que o direito existe em função dos homens e não o contrário.
Não há formalismo que possa nos impedir de tutelar a dignidade humana, diante da repressão desproporcional ou da desproteção dos valores mais singelos.
Para que os fortes se sobreponham pela força, a lei da selva sempre foi suficiente.
Deve haver uma razão para que a humanidade a tenha abandonado.
*Marcelo Semer é Juiz de Direito em São Paulo. Foi presidente da Associação Juízes para a Democracia. Coordenador de "Direitos Humanos: essência do Direito do Trabalho" (LTr) e autor de "Crime Impossível" (Malheiros) e do romance "Certas Canções" (7 Letras). Responsável pelo Blog Sem Juízo.
Fabiana Soler é vereadora do PT em Potim (SP). Formada em Comunicação Social pela UNESP de Bauru, é Administradora com extensa experiência na área de Pesquisas de Opinião Pública.
quinta-feira, 5 de maio de 2011
QUE (IN)JUSTIÇA É ESSA?
sexta-feira, 3 de dezembro de 2010
FATOR PREVIDENCIÁRIO É DECLARADO INCONSTITUCIONAL PELA JUSTIÇA FEDERAL
Na decisão, o juiz federal Marcus Orione Gonçalves Correia, da 1ª Vara Federal Previdenciária em São Paulo/SP, afirma que o fator é inconstitucional por introduzir “elementos de cálculo que influem no próprio direito ao benefício”.
De acordo com o juiz, o fator cria limitações para obtenção do benefício além daquelas impostas constitucionalmente, “em especial, da aposentadoria por tempo de contribuição”.
Com a decisão, o juiz determinou que o INSS refaça o cálculo da aposentadoria do beneficiário, sem incidência do fator previdenciário.
Entenda o fator
O cálculo do fator previdenciário leva em conta a idade, o tempo de contribuição, a expectativa de sobrevida e a média dos 80% maiores salários de contribuição desde 1994.
Na prática, o fator reduz o valor do benefício de quem se aposenta por tempo de contribuição antes de atingir 65 anos, no caso de homens, ou 60, no caso das mulheres. O tempo mínimo de contribuição para aposentadoria é de 35 anos para homens e 30 para mulheres.
Para quem se aposenta por idade, a aplicação do fator é opcional – é usado apenas quando aumenta o valor da aposentadoria. Quanto maior a idade do beneficiário no momento do pedido de aposentadoria, maior o fator previdenciário, e portanto maior o valor do benefício.
O INSS tem uma página na qual é possível simular o valor do benefício, de acordo com a idade de aposentadoria (acesse por este link).
quarta-feira, 24 de novembro de 2010
Novo Código de Processo Civil pode reduzir à metade tempo de tramitação de processos judiciais

Marcos Chagas
Repórter da Agência Brasil
Brasília – O tempo de tramitação dos processos judiciais poderá ser reduzido em 50% com a eliminação de uma série de formalidades existentes no Código de Processo Civil (CPC). O projeto de lei que prevê mudanças no texto será votado na terça-feira (30), na comissão temporária destinada a reformular o código, instituída no primeiro semestre deste ano pelo presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). Depois de passar pela comissão, o texto será apreciado pelo plenário.
O ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Luiz Fux, que presidiu a comissão de juristas responsáveis pelas mudanças no código, destacou que, no caso de ações coletivas, a redução do prazo de tramitação judicial será ainda maior, podendo chegar a 70%.
“É perfeitamente possível afirmar que no contencioso de massa essa redução de duração do processo deve chegar até 70%. Nos processos tradicionais, pela eliminação das formalidades, nós podemos assegurar que a duração será reduzida em 50%”, disse o ministro.
Ele ressaltou que a supressão de possibilidade de apresentação de recursos nas diversas instâncias de tramitação, por exemplo, não retira do cidadão o direito constitucional à ampla defesa. Fux qualificou esses instrumentos de “absolutamente inúteis”, por servirem apenas para prolongar desnecessariamente o andamento dos processos.
Pelo projeto de lei, o réu em uma ação poderá recorrer da decisão apenas ao final do processo. Pelo código atual, o advogado de defesa pode requerer a impugnação da decisão do juiz nas várias instâncias de julgamento.
Além de tentar garantir maior celeridade aos processos, o projeto relatado pelo senador Valter Pereira (PMDB-MS) estabelece mudanças pontuais. Uma delas é garantir à união estável o regime jurídico do casamento.
Pelo projeto, os honorários advocatícios, quando o processo envolver a Fazenda Pública, serão alterados. A proposta é criar faixas de ressarcimento pelos serviços prestados, em vez dos patamares de 5% a 10% em vigor. Segundo o relatório de Valter Pereira, quanto maior for o valor da questão em discussão, menor o percentual de honorários.
O peemedebista também incorporou a proposta do novo Código de Processo Civil alguns projetos de lei que alteram a lei em vigor e tramitam no Legislativo. Um deles é o que extingue o desquite e possibilita a um casal interessado em se separar requerer diretamente o divórcio. Essa possibilidade, entretanto, restringe-se a casos de separações consensuais.