quarta-feira, 19 de outubro de 2011

OCCUPY THE WORLD: ALEMANHA É A BOLA DA VEZ

Occupy the World chega à Alemanha

Uma nota curiosa das manifestações na Alemanha foi sua repercussão entre os políticos e na mídia, declaradamente simpática, mesmo entre os conservadores. O ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schäuble, da União Democrata Cristã, deu a tônica: declarou no sábado mesmo que encarava os protestos “muito seriamente”, e que os bancos devem se submeter “a controles muito claros e a transparência em todos os setores dos seus negócios”. O artigo é de Flávio Aguiar.

No sábado, dia 15, segundo a Attac, 40 mil pessoas ocuparam 50 cidades alemãs para protestar contra os bancos, o sistema financeiro e as políticas que privilegiam a “saúde” destes em detrimento da do povo. As maiores manifestações aconteceram em Frankfurt (5.000) e em Berlim (10.000). Na capital alemã os manifestantes se concentraram em frente ao Reichstag e à Chancelaria (sede do Executivo) durante a tarde de sábado.

Ao contrário de Roma e Chicago, não houve violência nem confronto com a polícia. Aliás, essa foi a tônica das manifestações que ocorreram em 951 cidades de 82 países: tudo transcorreu em paz. Em Berlim houve um empurra-empurra com os policiais quando, depois da manifestação, um grupo tentou entrar no Reichstag, o Parlamento alemão. Mas isso acabou logo e nem detidos houve.

Uma nota curiosa das manifestações foi sua repercussão entre os políticos e na mídia, declaradamente simpática, mesmo entre os conservadores.
O ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schäuble, da conservadora CDU (União Democrata Cristã), deu a tônica: declarou no sábado mesmo que encarava os protestos “muito seriamente”, e que os bancos devem se submeter “a controles muito claros e a transparência em todos os setores dos seus negócios”. Sigmar Gabriel, líder do social democrata SPD no Paralamento declarou, por sua vez, que é necessário separar “os bancos de investimento dos bancos comerciais”.

Mario Draghi, que deve em breve substituir Jean Claude Trichet na presidência do Banco Central Europeu disse que “os jovens têm direito de estar furiosos”, e o presidente da Comissão Européia (órgão executivo da U. E.), José Manuel Barroso acentuou que “temos visto comportamentos abusivos [no setor bancário]”.

Para completar, os sistema bancário levou uma saraivada de críticas na mídia, com diferentes matizes, é claro.

O “Tageszeitung”, descrito em geral como de esquerda, sublinhou que “os manifestantes não são esquerdistas, mas vêm do centro”. Manifestam um “vago desconforto pelo modo como a U. E. está sendo dirigida” e que “muitos não aceitam mais o discurso vazio da elite”. Mas destacou que, como a Alemanha não está sofrendo tanto os efeitos da crise quanto outros países, “também falta uma consciência do fato de que os bancos e os políticos alemães têm um papel central na crise”.

Já o “Süddeutsche Zeitung”, descrito como de “centro-esquerda”, ressaltou “o amargo desapontamento” como um dos impulsionadores da manifestação. Assinalou que em 2008 houve a esperança de que houvesse “uma reforma do capitalismo”, mas que “os bancos continuaram a jogar com os mesmos meios e métodos que levaram à crise financeira”. Destacou também que “os protestos internacionais exigem políticas internacionais” para resolver a crise.

Passando à direita do espectro midiático, “Die Welt” vê nas manifestações “um sentimento difuso de preocupação” pela estabilidade da moeda (o euro), a poupança e pelo padrão de vida. Considera que é necessário “proteger o sistema da fúria anti-capitalista que está crescendo”e que “seria uma pena que o movimento global “Occupy...”, tão colorido e criativo, se deixasse tomar pelos profissionais do protesto que são apenas nostálgicos dos velhos tempos do socialismo”.

Entretanto, reconhece que “é óbvio o fato de que sistema financeiro se tornou disfuncional, porque ele poderia ter se valido de uma maior regulamentação”. “Os bancos precisam se acostumar a correr apenas aqueles riscos que tenham capacidade de enfrentar – e a assumir a responsabilidade por eles”.

O “Frankfurter Allegemeine Zeitung”, mais próximo do mundo financeiro, descarregou parte da responsabilidade sobre os políticos: “políticos fizeram promessas a seus eleitores que não tinham condições de serem financiadas”. Mas também assinalou que “os políticos, que agora preparam a cúpula do G-20 em Cannes [em novembro] e que não levem em conta os protestos o fazem por sua conta e risco. O movimento criará pressão adicional em favor de uma regulamentação mais abrangente dos bancos e uma maior disciplina a ser aplicada sobre os mercados financeiros”.

As pressões cresceram também depois que uma reportagem do “Financial Times” trouxe à baila que o Deutsche Bank tem investimentos “a perigo” (“in exposure”) em cassinos de jogo em Las Vegas da ordem de 4,9 bilhões de dólares, mais do que 3,5 bi de euros. Para dar uma idéia do significado disso, compare-se essa quantia com os 3,67 bi de euros em créditos “a perigo” que o D. B. têm em títulos da dívida pública da Grécia, Portugal, Irlanda, Espanha e Itália... do total de 9,5 bi que ele tem em títulos da dívida pública de países europeus. Las Vegas foi das cidades norte-americanas que mais sofreram com a crise financeira de 2008 e que hoje tem uma das mais altas taxas de desemprego dos Estados Unidos.

Realmente, hoje em dia o sistema bancário tem com o que se preocupar. Até porque mais se fala na inevitabilidade de uma “reestruturação” da dívida grega (a que deverão se seguir outras reestruturações, pelo menos de Portugal e Irlanda), e que o sistema financeiro deve se preparar para arcar com perdas entre 30 e 50% dos títulos. Durma-se com um ralo desses.



Fotos: Flávio Aguiar

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